As organizações globais da indústria de serviços de Saúde vão aumentar seus gastos em cloud computing em 20% ao ano até 2020, quando o valor dos investimentos totais deve superar os US$ 12 bilhões, segundo relatório de empresa Persistent Market Research. Embora o setor tenha pouca experiência e habilidade em transacionar com redes distribuídas centradas na Internet, essa é uma tendência para os próximos anos, principalmente em nações emergentes como o Brasil. O número de contratos entre os provedores de serviços de nuvem e as empresas do setor de Saúde cresce, principalmente na direção da infraestrutura e dos softwares baseados em serviço. As vendas incluem registros médicos eletrônicos, sistemas de arquivamento de imagens, sistemas de controle farmacológico, softwares de gestão radiológica, sistemas de controle de análise clínica laboratorial, ERPs, etc. Tudo sendo fornecido como serviço, em contratos de SaaS e IaaS, com as aplicações flutuando nas nuvens de dezenas de grandes fornecedores.
Cloud computing ajuda a armazenar, gerenciar e processar dados de locais diferentes, fornecendo serviços hospedados através da Internet. A redução de custos ainda é o maior apelo para as indústrias de serviços. Nessa caravana digital não faltam outras vantagens para o mercado de Saúde, como a possibilidade de compartilhar informações do paciente entre os profissionais de saúde, ou o aumento da velocidade e flexibilidade dos serviços, ou a gestão em tempo real de imagens médicas, que serão cada vez mais disponibilizadas em nuvem (PACS). Do mesmo modo, os dispositivos móveis ganham cada vez mais popularidade na área médica, com milhares de aplicações (mHealth) apoiando os profissionais de Saúde e os pacientes. Essa integração tende a ser feita em ambientes de nuvem, onde os custos operacionais são menores e as restrições ficam mais contidas no vetor conectividade. Se “tiver banda boa, tem boa nuvem”.
Pesquisa publicada em 2014 pelo HIMMS (Healthcare Information and Management Systems Society) constatou que mais de 80% das organizações de Saúde já utilizam hoje alguma forma de serviços em nuvem nos EUA.
A computação em nuvem também aproxima o setor de Saúde das aplicações de Analytics, que combinam massas de dados através raciocínio sistemático, gerando análises para um processo de tomada de decisão mais eficiente. Utilizar a inteligência analítica significa melhorar o desempenho em domínios fundamentais da informação clínica, usando para isso sólidos instrumentos de análise de dados. Uma unidade hospitalar obstétrica, por exemplo, pode utilizar analytics para cuidar de bebês prematuros. Ela produz análises em tempo real com base na gravação da respiração e do batimento cardíaco da cada um dos recém-nascidos da unidade. Com sofisticados algoritmos consegue identificar padrões, que permitem prever infecções 24 horas antes de o bebê apresentar sintomas visíveis. Essa predição de eventos permite intervenções precoces e ações emergenciais variadas, mas pré-estabelecidas.
Da mesma forma, as aplicações analytics permitem utilizar modelos preditivos para decodificar, por exemplo, o DNA humano, fazendo-o em uma fração do tempo cada vez menor. Prevendo as probabilidades de certas doenças estarem presentes no código genético do paciente é possível ações preventivas. Embora seja tudo muito novo, já está claro que esse é o caminho, e para se chegar nele a computação em nuvem é de fundamental importância.
Some-se a isso o conceito de Big Data Analytics, que possibilita trabalhar com grandes volumes de dados estruturados e não estruturados, e que, uma vez coletados, armazenados e interpretados por softwares de altíssimo desempenho, podem apoiar sobremaneira grandes avanços científicos. Esse “cruzamento inteligente” também serve como bússola gerencial aos tomadores de decisão dentro da Cadeia de Saúde.
Desde 2014, o Google está oferecendo a hospitais e universidades espaço em nuvem para armazenar genomas. O Google Genomics permite análise dos genomas armazenados e a comparação entre eles. Apesar de não divulgar dados, a empresa afirma que o programa já tem pelo menos 3.500 genomas armazenados, tendo um custo US$ 25 anual para guardar um genoma. No futuro os médicos serão capazes de indicar tratamentos e medicamentos específicos (medicina personalizada) que funcionarão melhor para cada paciente, sendo que essa informação será extraída exatamente da sequência genômica de cada individuo.
O armazenamento de dados em massa (Big Data) abriu uma nova porteira na ciência e na gestão médica. A informação contida em vários tipos de sensores, devices, equipamentos de monitoramento clínico, smartphones, etc., utilizados de maneira generalizada ao redor do mundo devido ao seu baixo custo, contém dados de valor inestimável para a pesquisa e para a medicina personalizada. Setenta e duas horas de vídeo são baixados do YouTube a cada minuto, sendo que em único ano 50 mil estudos de neurociência são publicados. Como armazenar, gerenciar, analisar e assimilar tanto conteúdo?
John E. Kelly, vice-presidente de pesquisas da IBM, em seu livro “Smart Machines”, publicado em 2013, dá pistas: “As mudanças que virão nas próximas duas décadas transformarão a forma como vivemos e trabalhamos da mesma maneira pela qual a computação transformou a paisagem humana nos últimos 50 anos. Com sistemas cognitivos será possível entender melhor o que está por trás das toneladas de dados que já temos, ou que filões de ouro de conhecimento e de novas realidades estão escondidos neles. A partir daí, podemos gerenciar melhor situações complexas, fazer previsões mais precisas e, portanto, nos antecipar melhor aos efeitos inesperados de nossas ações”. Sem sólidas estruturas de computação em nuvem, não teremos acesso a ferramentas de Big Data, ou Analytics, ou mesmo sistemas cognitivos. Tudo passará necessariamente pela nuvem. Seus custos de armazenamento, acesso e analise não deixam opção para verticalizar a informação médica gerada em grande escala.
IBM
Players do mercado de tecnologia vêm se preparando para ocupar espaços na área de Saúde oferecendo serviços de hospedagem em nuvem. A IBM, por exemplo, informou em agosto de 2015 que está em processo de aquisição da empresa de imagens médicas Merge Healthcare (um negócio de 1 bilhão de dólares) para mixar sua operação com a unidade de análises da própria IBM. A empresa planeja combinar dados e imagens da plataforma de gerenciamento de imagens médicas da Merge Healthcare com o seu sistema de saúde em nuvem. O software analisa grandes volumes de dados, entende questões complexas colocadas em linguagem natural e propõe respostas baseadas em evidências. Essa iniciativa ajudará médicos e pesquisadores a tomar decisões em função de macro e micro análises, que levam em consideração o histórico clínico do paciente, de sua família e dados de outras fontes de informação que analisam sintomas similares.
MODELOS
A maioria das organizações de Saúde não tem capacidade (nem recursos) para o desenvolvimento de modelos analíticos avançados, ou mesmo a infraestrutura necessária à integração de dados estruturados que chegam através de inúmeras fontes. Soluções baseadas em nuvem podem oferecer uma opção fácil e rentável para tratamento analítico dos dados, deixando para o hospital, por exemplo, focar sua atuação na melhoria da assistência ao paciente.
Grande parte dos serviços de computação em nuvem é oferecida em três tipos de contratos:
(1) SaaS – “software como serviço”, inclui na hospedagem todos os sistemas e aplicativos para serem rodados online, como as ferramentas de ERP e CRM, administração de estoque e finanças, etc., sendo que o cliente tem direito a suporte técnico remoto e atualizações automáticas;
(2) IaaS –“infraestrutura como serviço”, onde a empresa contrata o poder de processamento de computadores de última geração, que, embora estejam localizados em provedor de nuvem (Amazon, Google, Microsoft, etc.), são reservados exclusivamente para aquele negócio/cliente; e o
(3) PaaS – “plataforma como Serviço”, um modelo que fica entre o SaaS e IaaS, proporcionando uma plataforma mais robusta e flexível para a utilização de muitos recursos e onde é possível a utilização softwares de maneira mais flexível (sendo possível desenvolver suas próprias aplicações).
A contratação de serviços em nuvem está ancorada em contratos de SLA (service level agreement), que possuem garantias adicionais que um contrato comum de serviços não tem. Um SLA, por exemplo, estabelece um tempo máximo para que o provedor de nuvem recoloque o serviço no ar em caso de pane.
PRIVACIDADE
A maior preocupação continua sendo a segurança da informação. Já existem casos de violação de dados e as organizações de Saúde relutam em hospedar suas informações (um de seus maiores ativos) nas plataformas em nuvem. Os aspectos de segurança não envolvem somente o provedor da hospedagem em nuvem, mas todo o ecossistema que inclui o provedor de soluções de análise, a plataforma de integração de dados e uma série de outros players que precisam demonstrar robustez para garantir a privacidade e o sigilo das informações.
Da mesma forma, preocupam os aspectos ligados à interoperabilidade e portabilidade de aplicativos. A ‘portabilidade de dados de um serviço de nuvem para outro serviço de nuvem’ também é uma questão de grande complexidade, e que exige níveis compartilhados de garantia (o que nem sempre é fácil). Os países têm elegido ou criado agências reguladoras locais, cabendo a elas exigir que os padrões, normas e leis internacionais sejam aplicados no país. No Brasil essa normatização está sendo feita pela ABNT junto ao subcomite da ISO/IEC – JTC 1/SC 38. De qualquer forma, grandes esforços estão sendo feitos para reduzir os riscos e novas formas de lidar com a segurança de dados surgem todos os dias.
Modelos baseados em nuvem oferecem várias vantagens sobre os modelos tradicionais de software local, sendo as principais: (1) a redução nos ciclos de implementação e o (2) menor custo total de propriedade (TCO), sem contar que os serviços de cloud computing geralmente são baseados em contratos de serviço que eliminam a necessidade de altos investimentos iniciais em hardware e software. Além disso, a solução é “escalável”, ou seja, à medida que a organização cresce (ou decresce) o provimento de serviços pode ser aumentado ou reduzido sem impactos operacionais para a empresa.
A tecnologia de cloud computing está disponível em três formatos básicos: Nuvem Pública, quando as empresas partilham servidores e onde o fornecedor do serviço se responsabiliza pela hospedagem, manutenção e segurança dos dados do cliente (que paga apenas pelo que utilizar); Nuvem Privada, quando a empresa tem exclusividade no uso do servidor e dispõe de total controle sobre os recursos da nuvem; e Nuvem Híbrida, que mescla o que há de melhor nos dois formatos anteriores. No Brasil, por exemplo, a Telefonica Vivo já está capacitada a oferecer computação em nuvem híbrida.
UTILIZAÇÃO
Segundo dados da Brasscom (Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação), em 2015 o crescimento de utilização da computação em nuvem deve crescer 10% em relação a 2014, sendo que quase a metade dos empreendimentos nacionais já utiliza este tipo de recurso. Outro estudo global, publicado pela GfK, mostra que o armazenamento de conteúdos em nuvem é considerado essencial para quase um terço (31%) da população mundial que está on-line. A pesquisa, que envolveu 26 mil entrevistas em 22 países, mostrou que os países latino-americanos são aqueles que registram o maior número de adeptos da computação em nuvem, sendo que o México e o Brasil lideram a pesquisa.
AMPLIANDO A ADOÇÃO DA NUVEM
Um estudo do IDC (“InfoBrief – Não fique para trás: como ampliar a adoção da nuvem”), publicado em 2015 e que envolveu executivos de 3.400 empresas em 17 países, identificou cinco estágios de maturidade de adoção da nuvem: ad hoc (temporária, provisória), oportunista, repetível, gerenciada e otimizada. O estudo revelou que as empresas que utilizam ambiente em nuvem, e que aumentam sua maturidade do nível mais baixo (ad hoc) para os mais altos, obtiveram os seguintes resultados: (1) 10,4% de aumento nas receitas; (2) 77% de redução dos custos de TI; (3) 99% de diminuição no tempo de prestação de serviços e aplicações de TI; (4) 72% maior capacidade do departamento de TI em atender ao nível de serviço (SLAs); e (5) capacidade duplicada de investimento em novos projetos para impulsionar a inovação.
O estudo, que analisou empresas que utilizam nuvens públicas, privadas e híbridas, revelou também que os benefícios econômicos (quantitativos) identificados pelas empresas que adotaram nuvens mais “maduras” foram, em média, de US$ 1,6 milhão em receitas adicionais por aplicação em nuvem privada ou pública. Essas empresas também registraram redução de custos de US$ 1,2 milhão por aplicação baseada em nuvem. Segundo a pesquisa, globalmente o setor de manufatura tem a maior porcentagem de empresas que adotam ambientes em nuvem (com 33%), seguido de TI (30%), finanças (29%) e Saúde (28%).
Nos Estados Unidos, uma em cada cinco pessoas já utiliza aplicativos de mHealth em seus smartphones (em nuvem), sendo que o processo de nuverização na área de Saúde cresce de forma exponencial. A American Academy of Family Physicians, por exemplo, entidade que congrega médicos de família, fechou acordo em agosto de 2015 com a HealthFusion para oferecer um sistema integrado de EHR (Electronic Health Record), denominado MediTouch, aos seus 121 mil membros-médicos. O sistema funciona em nuvem e foi desenvolvido especificamente para médicos de família, com características peculiares de gestão clínica e protocolos de atendimento personalizado.
Hospitais, por exemplo, podem obter excelentes ganhos utilizando uma arquitetura de cloud computing para hospedar seus dados. Célebre por gerar massas de dados diários, geralmente armazenadas em papel, é muito fácil perder esses dados ao longo do caminho. A nuvem torna muito mais fácil acessar essas informações, tornando mais simples e flexível a gestão clínica do paciente e a gestão administrativa do hospital. No Brasil, por exemplo, é raro um hospital não gastar de três a quatro horas (no mínimo) para dar alta médica e fechar uma conta de internação. A coleta de dados e registros espalhados para várias áreas, armazenados em diversos computadores, com inúmeros funcionários coordenando as informações, cria um natural gigantismo operacional que deságua nos custos da entidade. Sem falar nos valores consumidos anualmente em manutenção, upgrade de sistemas, armazenamento vertical de dados, retrabalho, etc.
Da mesma forma, a informação centralizada em nuvem ajuda a detectar erros, avaliar diagnósticos equivocados, acompanhar o progresso do paciente e, acima de tudo, tomar decisões com mais rapidez a assertividade. Serviços em nuvem já possuem aplicativos capazes de identificar muito dos erros que ocorrem dentro dos hospitais, como, por exemplo, o lançamento errado de faturas ou falhas em handling de medicamentos. Da mesma forma, médicos podem acessar os dados clínicos do paciente (através de um Registro Eletrônico de Saúde em nuvem) de qualquer lugar e compartilhá-los com seus pares a qualquer momento. Ganha o hospital (redução de custos), ganha o médico (produtividade) e certamente ganha o paciente, que recebe um atendimento mais ágil e seguro.
Os ganhos da redução de custeio, na praticidade gerencial e na flexibilidade organizacional estão direcionando os players da Cadeia de Saúde para o ambiente de cloud computing. Em ambiente de crise e instabilidade econômica, mas rápida será essa migração.