Com números extremamente ruins apontando a baixa produtividade de médicos e enfermeiros nos hospitais por conta de processos burocráticos, formulários a serem preenchidos, dentre outros, o tempo gasto diretamente com o paciente é diminuto, chegando a números dramáticos. A enfermagem chega a gastar 70% do seu tempo em atividades não relacionadas com o paciente e apenas 30% diretamente no cuidado ao mesmo, e os médicos em uma relação quase equivalente de 60 / 40%.
Há então um crescimento de tecnologias automatizando as atividades no sentido de reduzir estes números e aumentar a produtividade, porém, muitos dos processos têm que ser revistos antes de automatizá-los simplesmente, já que se o processo é por si só burocrático, ineficiente e desnecessário, automatizá-lo será automatizar a burocracia e a ineficiência, sem falar da falta de necessidade do processo por si.
Felizmente, o mercado brasileiro começa a amadurecer e a utilizar cada vez mais as tecnologias, como, por exemplo, os sistemas de gestão clínica e hospitalar e os prontuários eletrônicos.
Por outro lado, isso traz uma nova questão que não pode ser de forma alguma deixada de lado: trazer estas tecnologias efetivamente fazem o efeito necessário Se não, por que?
Uma das principais razões é a imposição destas tecnologias sem uma participação mais direta do corpo clínico dos hospitais, e a falta de reanálise dos processos existente conforme citado acima.
A outra razão e fundamental é que as tecnologias têm que ter um caráter de usabilidade.
O que é usabilidade então? Segundo alguns, Usabilidade é a eficiência, eficácia e a satisfação de um usuário para complementar uma série de tarefas em um determinado sistema. Outra definição, por exemplo, considera Usabilidade como, a capacidade do sistema de ser usado por humanos de forma fácil e eficiente.
Particularmente, prefiro dizer que a Usabilidade é a forma de interação entre o humano e a tecnologia que responde de forma mais rápida, simples, padronizada e eficiente às necessidades.
Quando coloco rapidez, considero este item um dos mais importantes no processo de uso de tecnologia. Se ao preencher um formulário em papel e assinar levo menos tempo que fazê-lo em um sistema, com certeza tem algo errado. A performance do sistema é uma das principais preocupações da usabilidade. Conversando com o Dr. Renato Mazagão, Ortopedista do Hospital Israelita Albert Einstein, veio uma reclamação de um sistema de prontuário eletrônico que ele utilizou em outro hospital, onde, segundo ele, dava um “click” e tinha que ficar falando com o paciente enquanto demorava a resposta do sistema.
Por isso, não basta colocar um sistema de prontuário eletrônico em um hospital, se a infraestrutura de “data center” não é suficiente para ter uma performance boa, que o sistema tenha erros de projeto e falta de qualidade de produto (Software hoje na área de saúde é fundamental e precisa ser o mais exato possível, portanto testes e qualidade são básicos nesta área) ou ainda, a questão mais e mais preocupante no segmento, que são as integrações entre softwares necessários para operacionalizar o ambiente (também é vital que a integração seja a mais simples e mais eficiente possível)
Se estamos automatizando alguma atividade, a mesma deve já trazer coisas prontas e customizadas e a capacidade de executar a mesma tarefa não automatizada de maneira muito mais rápida.
Imagine-se, por exemplo, uma triagem executada em um sistema, onde por acesso ao prontuário eletrônico, já aparecem preenchidos no formulário eletrônico os dados de medicamentos tomados, cirurgias feitas, alergias, permitindo apenas pequenas atualizações evitando assim que a enfermagem tenha que preencher os dados sempre que for feita a triagem. Porém, sempre com a questão da performance envolvida, dar um click e demorar mesmo com os dados pré-colocados acaba por não dar a usabilidade devida.
Com relação a padronização, ela é cada vez mais essencial, troca-se de equipamentos médicos por mais modernos e tudo é diferente necessitando um novo treinamento e uma aculturação, ou pior, devido a situação de muitos ambientes hospitalares no país, é necessário se aprender para trás, ou seja, aprender como funciona um equipamento médico mais antigo para poder fazer face aos tratamentos de uma determinada região. Como não há uma padronização clara nesta área, isto cria uma perda muito grande de produtividade e capacidade de atendimento na ponta por falta de profissionais especializados em um determinado equipamento.
Importante também em relação aos softwares utilizados como o prontuário eletrônico que se tenha algumas características que trazem a simplicidade e a eficiência necessária:
- Familiaridade – Deve-se tentar criar telas e procedimentos que sejam mais próximos do que o profissional clínico está acostumado a trabalhar.
- Limpeza – As telas devem evitar ser rebuscadas e cheias de elementos.
- Navegabilidade – Deve-se evitar um volume alto de “clicks” para atingir um objetivo, ou seja, telas com vários menus, e sim que a navegação seja rápida e direta ao ponto.
- Controle de erros – Quando ocorrerem erros de uso, deve-se ter uma explicação imediata e muito clara para que o usuário não perca tempo em se corrigir, além de processos de aprendizagem adaptados ao ambiente. Quando ocorrerem erros de sistema (o que deve ser evitado), ter um help desk que consiga resolver o problema com SLA mínimo.
- Idioma e Linguagem – Idioma nativo da equipe clínica e, mais que isso, a linguagem natural que é falada por estes profissionais.
- Busca de Dados e Geração de Relatórios – Além da consistência e rapidez de obtenção, facilidade para a geração de relatórios que facilitem o trabalho da equipe. Inclua-se aqui todas as questões relativas à certificação digital necessária nos hospitais do país.
Com certeza, é um desafio para a maior parte das empresas que fornecem os equipamentos e sistemas no mercado de saúde, porém é fundamental para garantir o aumento do uso por parte dos médicos e enfermeiros e traduzir isso em aumento da produtividade destes profissionais.
Isso deve ser considerado pelos CIOs na estruturação de seus sistemas e integrações, pelos profissionais clínicos e de TI na escolha das melhores soluções de sistemas, e, claramente, pelos fornecedores no sentido de melhorar seus projetos e a aplicação dos mesmos.
Base Bibliográfica:
- Defining and Testing EMR Usability – HIMSS
- Evaluation of Healthcare Software from a Usability Perspective
- Journal of Medical Systems, Vol. 14, Nos. 1/2, 1990
- Medical Informatics – An Executive Primer – Ken Ong