Apesar da redução de recursos destinados à pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) nos últimos anos no país, o setor de saúde é de longe o preferido pelos fomentadores de plantão. As linhas de financiamentos também ficaram mais escassas, mas a inovação na saúde sofreu menos.
Segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil é um dos países do G-20 que menos investem em inovação. Enquanto o percentual do Produto Interno Bruto (PIB) que tem esta destinação não chega a 1%, em países como Estados Unidos e Alemanha é de 2,8%. Já no Japão e Coreia do Sul, este indicador sobe para 3,4% e, na Suécia, avança para 3,6%.
Enquanto o governo federal reduziu pela metade o patrocínio de alguns programas, o Estado mais rico do país contingenciou menos. Números da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) indicam que, se olharmos isoladamente a relação PIB paulista comparada com a de países como Portugal, Canadá, China e Reino Unido, o Estado não está tão mal na fita. Todos aplicam próximo a 1,8% do PIB respectivos nessas atividades.
Em São Paulo há quase 15 mil empresas que desenvolvem alguma atividade de pesquisa para inovação. O problema é que há mais pesquisadores – 74 mil – do que pesquisa sendo realizada. Dados de 2015 mostram que foram aplicados R$ 27,5 bilhões entre governo paulista, instituições privadas, públicas e universidades da região. “São Paulo investe sozinho cerca de 10 vezes mais do que o Rio de Janeiro e 25 vezes mais do que Minas Gerais, e cria mais artigo científico do que qualquer país da América Latina”, diz Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp. Cerca de 43% dos projetos de inovação que passam pela entidade são na área de saúde (28%) e biotecnologia (15%). O órgão fica com 1% da receita tributária anual do Estado. Em 2016 teve dispêndio de R$ 1,2 bilhão.
Com um programa voltado para inovação em empresas com até 250 funcionários, em 2016 foram atendidos 220 projetos que receberam individualmente até R$ 1,2 milhão. “Este ano até agora só foram aprovados 20 projetos na área da saúde, que consumirão R$ 100 milhões ao longo de três anos”, afirma Brito.
Diante da diminuição de projetos financiados, a Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo), que representa 330 empresas na área, alerta que este é um setor intenso em atualização tecnológica. “A vida útil média de seus equipamentos é de dois anos. E para não ficar obsoleto, tem que renovar”, afirma Márcio Bósio, diretor institucional da entidade.
Bósio alerta ainda que existe uma distância entre a pesquisa e a sua conversão em produto. “Isso porque boa parte do financiamento nesta etapa sai a risco da empresa”, afirma. Ele diz que além dos órgãos e bancos oficiais estarem reduzindo os recursos, muitos fundos de Venture Capital (capital de risco) no Brasil não querem investir nesta fase inicial do projeto, o que inibe iniciativas de inovação e incentiva o de transferência do que já deu certo em outros países. A questão tributária é outro inibidor. “Hospitais públicos e filantrópicos são isentos para importar produtos e não recebem nenhuma isenção em relação à compra de produto nacional similar”, afirma. O setor, que vinha avançando sua receita em dois dígitos por ano desde a década de 90, teve crescimento nominal de 7% no último ano em relação a 2015, o que provocou queda de 50% na quantidade de novos projetos de inovação na área. Em 2016, faturou próximo a R$ 9 bilhões.
Classificando o momento de criação no setor de saúde como o de mudança de paradigma, a Finep, órgão de financiamento à inovação ligado ao governo federal, que atua por vezes junto com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e social (BNDES), tem programas que também vêm sendo impactados com a política de contingenciamento fiscal. Na Finep, a escalada sai de um total de 50 novos projetos contratados na área de saúde em 2014 para 22 em 2015 e dois no ano passado na modalidade reembolsável.
As liberações financeiras também despencaram de um total de R$ 466 milhões em projetos reembolsáveis em 2014 para R$ 50 milhões em 2016. “O recurso não reembolsável ficou mais escasso, apesar de ser fundamental para apoiar inovação na saúde”, diz Igor Ferreira Bueno, superintendente da área de saúde da Finep. De 2013 para 2016, os recursos não reembolsáveis caíram 30% em desembolso para R$ 11 milhões. E este ano será totalmente contingenciado. “Os cinco contratos de projetos de saúde em análise na entidade são reembolsáveis e devem consumir, se aprovados, próximo a R$ 110 milhões”, indica Bueno.
No BNDES também houve mudanças. O banco elevou a régua de exigência mínima para financiamento de projetos à inovação na área da saúde e saiu de um piso de R$ 1 milhão em 2016 para R$ 10 milhões este ano. “Tivemos redução também no número de programas que saíram de 100 para 50 de 2016 para 2017. Hoje, a política operacional está mais focada em projetos e menos em setores”, afirma João Paulo Pieroni, chefe do departamento do complexo industrial e de serviços da saúde do BNDES.