Não é de hoje que o mundo corporativo tem criado estruturas e normas cada vez mais estritas para combater desvios e promover um ambiente de negócios ético no país. Assim como também são contínuas suas iniciativas para aperfeiçoá-las, acompanhando a própria evolução dos valores e princípios praticados ao redor do mundo.
Na última década, inúmeras associações e entidades representativas da área da Saúde implementaram Códigos de Conduta para nortear as atividades e o comportamento de seus associados, em um esforço cada vez maior para reduzir desvios éticos e práticas inadequadas.
As empresas também adotaram seus próprios Códigos de Ética e muitas contam, inclusive, com áreas muito bem estruturadas de compliance. E nem poderia ser diferente. Diante das dimensões e capilaridade de um país como o Brasil, a gestão de risco, mais do que importante, é uma questão de sobrevivência para elas.
Due diligences (o processo de investigação realizado para avaliação dos riscos de uma transação comercial) de fornecedores e distribuidores, por exemplo, foram incorporados à rotina de muitas empresas, motivando uma periódica atualização de comportamentos e contratos.
Além de dar origem a treinamentos permanentes, os códigos implementados por associações e empresas têm sido submetidos a uma série de revisões, para incorporar práticas éticas mais modernas e eficazes, com o intuito de reduzir o risco de corrupção e a vulnerabilidade das relações com os diversos públicos.
Para nos basearmos também em algumas boas práticas adotadas em outros países, não foi por acaso que leis como o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), criada em 1977 nos Estados Unidos, e o UK Bribery Act, do Reino Unido, tornaram-se marcos mundiais importantes no combate à corrupção. Como ocorre no terreno da Ética, elas surgiram em resposta a uma necessidade da própria sociedade da qual emergiram e como reflexo do avanço e da maturidade que alcançaram.
Assim como não foi por acaso também que o Brasil regulamentou em 2015 a Lei Anticorrupção, que representou um grande avanço ao prever a responsabilização civil e administrativa de empresas que praticam atos lesivos, além de atender a compromissos internacionais assumidos pelo país.
O Brasil vive um processo único de amadurecimento ético. Nunca o momento foi tão oportuno para a revisão de conceitos, valores e comportamentos. A Operação Lava-Jato e a chamada “Máfia das Próteses”, que causaram perplexidade e uma justa indignação ao país, expuseram as entranhas de práticas que a sociedade não tolera mais e prestaram – e ainda prestam – um inestimável serviço a todos.
Sem a movimentação da sociedade, que foi às ruas protestar contra um modelo viciado de se fazer negócios, trazendo à tona a necessidade premente de uma mudança de comportamento e de cultura, nada disso teria acontecido ou, na melhor das hipóteses, ocorreria muito mais lentamente.
O debate sobre ética e corrupção, que ganhou as ruas e se tornou muito mais presente no meio empresarial, no mundo político e na sociedade, também se intensificou na área da saúde. Se no âmbito interno as empresas buscam aperfeiçoar seus mecanismos de gestão de risco, no âmbito externo é grande a movimentação do setor, que já debate a adoção de práticas conjuntas de combate à corrupção.
Assim como o papel e comprometimento da alta direção das empresas é fundamental para que uma mudança de cultura ocorra de fato em cada uma delas, o papel e comprometimento de todos os agentes da cadeia de saúde é primordial para que ocorra uma mudança de fato nas relações comerciais do setor. Sem o envolvimento e a contribuição de todos os seus elos, – fornecedores, prestadores de serviço e operadoras – ficaremos apenas no terreno das ideias e das boas intenções.
Sabe-se hoje, e não faltam exemplos nos noticiários nacionais e internacionais, que o preço a pagar por condutas antiéticas é muito alto, podendo custar a reputação e, muitas vezes, a própria sobrevivência das empresas. Vivemos atualmente no país um cenário de transição e promissor. Nunca foi tão grande a oportunidade de melhorarmos não apenas as relações entre os agentes da cadeia da saúde, como sobretudo a eficiência e sustentabilidade do sistema de saúde, nos aproximando um pouco mais do modelo justo e inclusivo de assistência que desejamos para o país.
* Carlos Alberto P. Goulart é presidente-executivo da ABIMED – Associação Brasileira da Indústria de Alta Tecnologia de Produtos para Saúde
**Artigo publicado na 46ª edição da revista HealthCare Management. Clique e confira a edição completa.