Apesar da não existência de pesquisas conclusivas sobre o jejum intermitente (JI), este protocolo de distribuição dos horários de alimentação tem gerado polêmica entre adeptos e até mesmo na classe médica. O tema será um dos destaques do 73º Congresso Brasileiro de Cardiologia, entre os dias 14 e 16 de setembro, em Brasília.
Uma pesquisa recente do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP) apontou que o jejum intermitente (JI) reduz o peso, mas pode aumentar o risco de diabetes tipo 2. O experimento foi feito com ratos jovens, que ficaram 24h sem comer e 24h com alimentação à vontade, pelo período de três meses. Apesar de perderem mais peso, os ratos submetidos ao JI apresentaram mais distúrbios metabólicos e inflamatórios, aumento dos radicais livres e da secreção de insulina no pâncreas, diminuição da estrutura celular que secreta a insulina, redução periférica da resposta à insulina, aumento do tamanho do estômago e prejuízos no crescimento. A autora do estudo e bióloga Ana Cláudia Munhoz Bonassa ressaltou, no entanto, que são necessários mais estudos randomizados e de longo prazo, principalmente em humanos para conclusões mais precisas.
O presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia gestão 2016-17, Marcus Vinícius Bolívar Malachias, estudioso do tema, analisou os ensaios que existem até o momento, em animais e em humanos. “Primeiro é preciso deixar claro que o jejum intermitente não é propriamente uma dieta. Em geral, no JI, adota-se a abstinência da alimentação por períodos programados, como por 12 ou mais horas (h), voltando a comer, com ou sem restrições, no restante do período do dia, sendo a relação 16:8h a mais utilizada. Há também o jejum total ou quase pleno (<25% da necessidade calórica) por 24h, seguido de não restrição no dia seguinte. Nas modalidades de jejum de 24h, em geral é adotada a relação 2:5, onde o jejum é feito em dois dias da semana. Mas há muitas outras variedades de JI”.
De acordo com o cardiologista, as evidências são ainda limitadas, sendo a maioria dos estudos realizados em animais. Uma pesquisa norte-americana com ratos adultos revelou que o JI levou a redução do peso e aumento da expectativa de vida em 30%. Experimentos com camundongos submetidos ao JI revelaram até 40% menor declínio da função cognitiva com a idade. “A maior utilização de cetona no JI, parece proteger a integridade da substância branca cerebral dos efeitos do envelhecimento. Há indícios de que o JI promova ainda um aumento de sinapses em neurônios granulares do hipocampo dentado e maior liberação de fator neurotrófico cerebral, auxiliando o aprendizado e a memória”, afirma Malachias.
Estudos em seres humanos
Alguns ensaios em humanos apresentaram resultados interessantes, segundo Marcus Vinícius Bolívar Malachias. “Em três estudos, com 12h ou mais de JI (mas menos de 24h) houve perda significativa de peso (< 5,0 kg) e da gordura corporal, sem alteração da massa magra. Outros nove ensaios de JI de 24h parcial e um estudo de total, em dias alternados, demonstraram reduções ainda mais significativas no peso corporal (> 5,0 kg) e massa gorda, sem reações adversas significativas”, revela.
E foram vários os benefícios. “Nos estudos, o JI promoveu reduções no colesterol total de 6% a 21%, no LDL de 7% a 32% e, nos triglicerídeos de 16% e 42%. Houve significativa queda na pressão arterial sistólica (3% a 8%) e diastólica (6% a 10%) após 6 a 24 semanas de JI. Em indivíduos com sobrepeso e pré-diabetes, ocorreu melhora da sensibilidade à insulina e redução da glicemia (3% a 6%)”, conta o cardiologista.
Apesar disso, ele vê o tema com cautela. “O controle de peso constitui um dos mais difíceis desafios da prática clínica. O JI revela-se como mais uma alternativa a ser considerada em casos selecionados, junto a restrição alimentar, prática de exercícios físicos e uso de fármacos, quando indicado. Atualmente, considero ainda não haver segurança para o emprego do JI em crianças, adolescentes, diabéticos em uso de medicamentos e pacientes com risco cardiovascular ou global alto”, finaliza.
Serviço:
73º Congresso de Cardiologia
Data: de 14 a 16 de setembro
Local: Centro Internacional de Convenções de Brasília – CICB
Endereço: SCES Trecho 2, Conjunto 63, Lote 50 – Asa Sul, St. de Clubes Esportivos Sul Trecho 2 – Brasília, DF, 70200-002