Chegará o dia onde homem e máquina trabalharão lado a lado dividindo funções, opiniões e estratégias para determinar a forma de tratamento mais eficiente para curar um paciente. A evolução da Inteligência Artificial (AI) atingirá um patamar tão avançado que os contos de Isaac Asimov, em “Eu Robô”, ou o antagônico HAL 9000, computador de “2001 uma Odicéia no Espaço”, de Arthur C. Clarke, não serão mais obras de ficção científica, mas sim uma realidade.
Essa evolução não se trata de desenvolver sistemas capazes de amar ou qualquer outro sentimento como as obras de ficção citadas relatam, mas sim, AIs capazes de emitir, de maneira autônoma, opiniões e até mesmo planos de ação baseados em lógica e conhecimento científico.
Deixando a ficção de lado, vemos hoje um grande movimento por parte da indústria de tecnologia no desenvolvimento de computação cognitiva, machine learning e deep learning. De acordo com um relatório divulgado em abril, pelo IDC, consultoria especializada nos mercados de TI e Telecom, a despesa global com sistemas cognitivos e inteligência artificial atingirá a marca de US$ 12,5 bilhões em 2017, representando um aumento de 59,3% em relação ao valor investido no ano anterior.
Ainda segundo o relatório, essas duas áreas continuarão recebendo investimentos corporativos em massa nos próximos anos, alcançando um crescimento anual médio de 54,4% até 2020 quando as receitas serão superiores a US$ 46 bilhões. Desse total, os Estados Unidos lideram o ranking com US$ 9,7 bilhões do total investido nessas tecnologias em 2017.
Para o diretor de pesquisas do IDC, David Schubmehl, as aplicações inteligentes baseadas em computação cognitiva, inteligência artificial e deep learning são a próxima onda de tecnologia que transformarão a maneira como consumidores e empresas trabalham, aprendem e atuam no mercado e na sociedade. “Estas aplicações vêm sendo desenvolvidas e implementadas em plataformas de software cognitivos/AI que oferecem as ferramentas e capacidades para fornecer previsões, recomendações e assistência inteligente por meio do uso de sistemas cognitivos, machine learning e inteligência artificial. Uma parte fundamental da infraestrutura de TI, e todas as empresas precisam entender e planejar a adoção e o uso dessas tecnologias em suas organizações.”
Outro exemplo sobre como o mercado vem apostando nessa nova onda tecnológica foi o investimento de US$ 50 milhões no Vector Institute, realizado pela província de Ontário, no Canadá. O Vector Institute é um novo centro de pesquisa voltado para o desenvolvimento e pesquisas na área de Inteligência Artificial com foco em aprendizagem de máquina e deep learning e tecnologias que utilizam softwares e algoritmos para simular os circuitos neurais do cérebro humano para calcular quantidades enormes de dados.
O instituto espera receber também outros US$ 80 milhões de mais de 30 empresas dos setores de saúde, financeiro, seguros, varejo, telecomunicações, manufatura, tecnologia, transporte, mineração, construção e logística, que poderão se beneficiar das tecnologias que serão desenvolvidas.
“O Vector Institute é um ótimo exemplo de como estamos firmando parcerias com o setor privado e instituições acadêmicas para garantir que Ontário promova a inovação. É mais importante do que nunca que tomemos medidas para ficarmos na vanguarda quando se trata de Pesquisa e Desenvolvimento e comercialização em uma economia altamente competitiva baseada no conhecimento”, explica Brad Duguid, Ministro do Crescimento e Desenvolvimento Econômico da região.
No entanto, os investimentos nesse tipo de tecnologia não são novidade. A melhoria dos sistemas de inteligência artificial capazes de minerar dados ficou explícita em 2011, quando o famoso computador Watson, da IBM, venceu um grupo de pessoas em um jogo de perguntas livres ao ser capaz de ler meio bilhão de páginas de informações em três segundos.
Diante desse cenário, com sistemas capazes de ler e interpretar centenas de milhares de informações em poucos segundos e cruza-las chegando em uma série de probabilidades profissionais de saúde dependerão menos de sua experiência e do que se lembram a respeito de um determinado paciente. Em vez disso, terão diagnósticos automáticos produzidos a partir de informações coletadas por sensores, bases de dados com milhões de casos clínicos semelhantes, ampla disponibilidade de acesso por meio de nuvens computacionais e inteligência computacional proveniente do aprendizado de máquina.
“Os grandes desafios desta perspectiva são a integração de múltiplos sistemas hospitalares heterogêneos existentes, a necessidade de adequação de protocolos médicos já consolidados e a padronização dos dados clínicos para um formato estruturado. Tudo isso exigirá reuniões, negociações, definições de padrões etc. Com certeza não será fácil, mas as vantagens são tantas que a opção parece irresistível”, acrescenta o garante o professor Osvaldo Novais Júnior, da Universidade de São Paulo (USP).
Machine Learning
Para o diretor da TOTVS Labs, laboratório de inovação da empresa no Vale do Silício, Vicente Goetten, o aprimoramento de tecnologias como Machine Learning irão aumentar a capacidade dos profissionais em fazer saúde. Como exemplo, o executivo menciona a aprovação, feita pelo FDA em janeiro desse ano, da plataforma de imagem da Arterys.
Essa plataforma é a primeira ferramenta baseada em machine learning a ser aprovada pelo órgão regulador americano e auxiliará médicos a diagnosticar problemas cardíacos em pacientes. A ferramenta utiliza uma rede neural artificial e auto-didata que, até o momento, analisou e aprendeu sobre mil casos relacionados a problemas cardiológicos.
A primeira aprovação do FDA para um aplicativo de aprendizagem de máquina para ser usado em um ambiente clínico é um grande passo para a inteligência artificial e aprendizagem de máquina para o setor de saúde e a indústria como um todo.
“Imagine ouvir os batimentos cardíacos de um paciente e que essa máquina já faça o diagnóstico. A intel comprou uma empresa, em 2016, que realiza exatamente esse tipo de procedimento. Acho que este é o primeiro beneficio que podemos usar como exemplo, médicos e enfermeiros terão sua capacidade de análise aumentada e com diagnósticos mais precisos”, acrescenta Goetten.
O uso da tecnologia em núvem e Big Data também são aliados para alavancar o desenvolvimento dessa tecnologia, uma vez que, quanto mais dados houver disponíveis para análise, melhor. Segundo o executivo da TOTVS Labs, as pessoas estão cada vez mais se monitorando por meio de wearable devices, o que é considerada mais uma fonte de dados, e o desafio agora é organizar essas informações. “O setor de saúde é tradicionalmente uma área que demora para adotar essas tecnologias, seja por um perfil conservador ou por questões regulamentórias. Mas esse é um caminho sem volta. A AI transformará todos os setores da economia, principalmente a saúde, não teremos nenhuma aplicação no futuro que não utilize esse tipo de tecnologia”, avalia Goetten.
Um grande volume de dados organizados aliados à informações genéticas, por exemplo, poderá tornar tratamentos mais eficientes e impulsionar a medicina personalizada, melhorando a eficiência terapêutica, reduzindo custos, tempo de internação e até realizando análises preditivas de epidemias. O grande desafio relacionado ao grande volume de dados disponibilizados está em como as organizações preservarão as informações do paciente, efetuarão a segurança e sigilo.
Para o diretor de marketing da Salesforce para América Latina, Daniel Hoe, a utilização dessa tecnologia é uma das bases para o avanço da AI e o machine leraning pode seguir por diversos caminhos dentro do setor de saúde.
“Um dos caminhos, talvez o mais critico é o machine learning auxiliando no laudo de doenças, como oncologia, por exemplo, no reconhecimento de imagens”. Já um segundo caminho apontado pelo executivo da Salesforce, e que vai além das intervenções terapeuticas e diagnósticos, é o relacionamento, utilizar essa tecnologia para auxiliar o atendimento do paciente.
“Hoje, o relacionamento com o cliente é um dos grandes diferenciais para o negócio das empresas, como fazem AirBnB e Amazon oferecendo uma experiência excepcional no atendimento ao cliente, por exemplo”, ressalta Hoe.
As empresas de saúde já sabem que terão de usar esse tipo de tecnologia para oferecer um melhor suporte ao cliente paciente utilizando informações básicas de cadastro, como alergias.
Sobre o risco da singularidade tornar-se um problema real, o executivo da Salesforce diz que seria muito “interessante” poder trabalhar com inteligências artificiais como os icônicos C3PO e R2D2, de Guerra nas Estrelas ou até mesmo o T800, de O Exterminador do Futuro ou HAL 9000. Mencionando a primeira Lei da Robótica, criada pelo escritor russo, Isaac Asimov, “um robô não pode ferir um humano ou permitir que um humano sofra algum mal.”
“É importante levarmos em consideração que a tecnologia é uma assistente da humanidade. Nossa visão é da tecnologia como aliada do ser humano e não uma substituta. Acreditamos que a base do sucesso dessa tecnologia será a confiança nesses sistemas. A responsabilidade da indústria é justamente honrar esse compromisso de confiança entre homem e máquina”, conclui Hoe.