Nesta terça-feira (6), a Anvisa e a Polícia Federal realizaram uma ação para interdição e fechamento de estabelecimentos do segmento de implantes odontológicos que atuam ilegalmente no Paraná. Foram concretizadas três fiscalizações em Curitiba e em Pinhais que resultaram na apreensão de mais de 200 mil implantes e componentes implantáveis sem registro da Anvisa. Os responsáveis pelas empresas foram encaminhados à Polícia Federal.
“Nos dois endereços fiscalizados em Curitiba encontramos a produção de componentes implantáveis sem registro. Na ação em Pinhais também foram constatadas produções irregulares. Os responsáveis pelos estabelecimentos foram conduzidos à Polícia Federal. Trata-se de um crime hediondo com pena de 10 a 15 anos de reclusão”, declara João Roberto Ferreira de Castro, fiscal federal da Anvisa.
Objetivando combater a industrialização e comercialização de implantes dentários e componentes implantáveis falsificados e sem registro na Anvisa, a ação vem realizando uma série de operações desde 2016. Ao todo, após abordagens na capital e no interior de São Paulo, em Goiás, João Pessoa e Recife, foram apreendidas cerca de 350 mil peças irregulares. “A Anvisa dará continuidade a essas inspeções, atendendo às denúncias. Há outros estabelecimentos em outros estados com empresas clandestinas sem a licença sanitária municipal e sem autorização, produzindo sem registro no órgão regulador”, declara Castro.
De acordo com a ABIMO, dos mais de 2 milhões de implantes feitos no país, 30% são realizados com produtos sem procedência, sem o conhecimento do consumidor. A utilização de implantes de procedência duvidosa gera danos graves ao paciente odontológico, como relembra Castro. “Pode haver uma rejeição, uma infeção por falta de esterilização e pela ausência de matéria-prima qualificada. O paciente, ao usar um produto desse se submete à infecções que podem resultar na extração do implante dentário com perda de massa óssea, gerando a necessidade de um enxerto ósseo e complicações que podem, inclusive, levar à óbito”.
OPERAÇÕES FAKE I E II
Os primeiros movimentos da Anvisa começaram em julho de 2016 com uma grande apreensão na Zona Leste de São Paulo (SP) – mais de 90 mil peças – e um preso. Com um enorme estoque organizado e embalagens personalizadas, a condição precária de higiene na fabricação foi o que mais chamou a atenção no caso. Separados em bacias e “tratados” com esponjas de cozinha, os produtos finalizados vinham com indicação de esterilidade na embalagem.
A partir dessa apreensão, foi deflagrada a Operação FAKE e um dentista foi preso em João Pessoa (PB) por adquirir implantes da fabricante irregular em São Paulo.
Outro estabelecimento, desta vez uma clínica-escola que atua com especialidades odontológicas e cursos de graduação e pós-graduação, foi abordado. Segundo o promotor de Justiça e diretor do MP-Procon, Glauberto Bezerra, além de implantes e componentes sem registro, foram encontrados medicamentos vencidos, equipamentos sem a segurança necessária e irregularidades na documentação dos alunos, inclusive com alguns cursando pós-graduação sem apresentar registro de inscrição no órgão.
Já em dezembro de 2016 em Valinhos, interior paulista, outra fábrica clandestina foi alvo da operação. Por lá, várias máquinas eram usadas para produzir os componentes protéticos e, ao mesmo tempo, peças do setor automobilístico. Mais uma vez, os produtos eram fabricados sem as mínimas condições de higiene. No caso, além da fabricação irregular, os fiscais constataram pirataria, muitos documentos e materiais de comunicação fraudulentos (como, por exemplo, um folheto com autorização falsificada da Anvisa).
Esta ação em Valinhos contou com apoio da Guarda Municipal, resultando na prisão de pai e filho (proprietário da fábrica). “O que chama a atenção nos registros dessas apreensões é a total falta de pudor dos falsários”, comenta Paulo Henrique Fraccaro, superintendente da ABIMO. “As peças pirateadas são guardadas etiquetadas com os nomes dos fabricantes originais, com um exímio controle”, lamenta.
A segunda fase da operação, já no início de 2017, chegou a Goiás e teve, como alvo, uma distribuidora. Segundo a Anvisa, pelo menos nove dentistas compravam implantes piratas desse estabelecimento. A agência fechou, também no interior de São Paulo, mais uma fábrica e outra distribuidora, ambas pertencentes à mesma pessoa que fabricava cópias piratas em Indaiatuba e as distribuía a partir de Campinas. Na fábrica, foram apreendidos mais de 3,2 mil componentes falsificados e, na distribuidora, outras 34,5 mil unidades.
INDÚSTRIA
Do lado da indústria, as ações vêm deixando satisfeitos os empresários que andam na legalidade: “o trabalho de repressão às empresas irregulares é muito importante para o setor da implantodontia, pois, à medida que algumas empresas irregulares estão sendo fechadas e seus responsáveis presos, a sensação de impunidade com relação a esse delito diminui”, conta o diretor da Emfils, Fábio Embacher. “Além desse recado importantíssimo com relação ao crime praticado por aqueles que vendem e, também, aqueles que compram produtos irregulares, essas ações permitem que o assunto de rastreabilidade volte a ser discutido entre ABIMO, CFO e Anvisa para, assim, melhorarmos a continuidade da regularização do setor”, destaca.
Fernando Mazzarolo, CEO da SIN Implantes, concorda: “acreditamos que estes trabalhos trarão resultados para redução dos riscos à saúde pública, principalmente na direção dos estudos sobre rastreabilidade junto ao profissional dentista”, diz.
A líder no mercado, Neodent, também é incomodada pelos produtos piradas: “não raro, reclamações que envolvem queixas técnicas ou eventos adversos resultam, após investigações, na descoberta de produtos não originais”, diz Jafte Carneiro, vice-presidente Jurídico e Compliance do Grupo Straumann (ao qual a empresa pertence). “Os casos de cópias que nos deparamos são enviados como denúncia à Vigilância Sanitária ou são alvo de ações judiciais”, declara.
RESPONSABILIDADE
Segundo Joffre Moraes, gerente de estratégica regulatória da ABIMO, cabe ao dentista informar ao paciente a procedência de implantes e componentes. “O paciente pode e deve perguntar ao profissional a origem do material, e não simplesmente abrir a boca deixando que lhe coloquem algo que ele não sabe de onde veio”, ressalta. Moraes explica, ainda, que todos os componentes e implantes regulares saem da fábrica com etiquetas de rastreabilidade às quais distribuidoras e dentistas têm – ou devem ter – acesso. “Na própria embalagem do produto constam as informações como fabricação, registro, lote, etc”, frisa.
A ABIMO negocia, junto a entidades do setor odontológico, a obrigatoriedade de uma carteirinha para os pacientes, por meio da qual informações de rastreabilidade do produto possam ser fornecidas. Segundo o advogado Rodolfo Tamanaha, o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Odontologia têm apenas o poder de polícia do exercício profissional, mas não o poder de regulamentar a profissão, que é reservado à lei. Porém, os dentistas que forem pegos usando material irregular podem ser enquadrados em diversos artigos, inclusive do âmbito criminal. “Toda essa ação visa termos consumidores mais seguros, satisfeitos e confiantes, além do fortalecimento da reputação do setor odontológico e de seus profissionais”, finaliza Tamanaha.