No Brasil, apesar de as unidades de saúde terem acesso a computadores, a cultura dos registros eletrônicos ainda é pouco difundida. É o que revela a última Pesquisa sobre o Uso das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC), divulgada pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic).
A pesquisa mostrou que a infraestrutura tecnológica nos hospitais está elevada, 94% dos estabelecimentos utilizam computadores e 91% tem acesso à internet. Além disso, 83% dos hospitais estão familiarizados com as rotinas operacionais básicas de automação como cadastro de pacientes, estoque e faturamento. No entanto, as informações clínicas ainda têm baixa adesão no que se refere ao registro de diagnósticos, pois apenas 49% dos hospitais utilizam a tecnologia nesse quesito, e só 40% usam na prescrição de medicamentos.
Para Raphael Castro, gerente comercial da Wareline, empresa especializada em desenvolvimento de sistemas de informação hospitalar, a tecnologia hoje deve ser vista como uma grande aliada na melhoria e otimização dos atendimentos em saúde, trazendo benefícios principalmente para o paciente. “A tecnologia cumpre um papel fundamental na gestão dos hospitais e na troca de informações dos processos operacionais. O que falta, no entanto, é uma organização de processos clínicos para que ela seja útil também na gestão dos pacientes, isto é, na análise dos sintomas e tratamentos”.
Ao registrar esse tipo de informação, gerando conhecimento sobre o estado clínico do paciente, os profissionais de saúde teriam ao seu dispor mais subsídios para a tomada de decisões. “Nesse sentido, o prontuário eletrônico é um bom exemplo, pois possibilita a interação do corpo clínico, isto é, entre os profissionais de saúde. Com o registro dessas informações, todos do corpo clínico tem acesso à evolução do paciente e, por isso, as decisões tendem a ser mais eficientes”, avalia Castro.
A gestão em algumas unidades que aderem às ferramentas está tão avançada que prescrição de medicamentos, anotações da equipe de enfermagem e imagens de exames também ficam disponíveis. “É importante ressaltar que, mesmo com todo esse raio-x do paciente, a confidencialidade e segurança dos dados são preservadas, respeitando as recomendações do Conselho Federal de Medicina”, destaca o gerente da Wareline.
Experiência contraria estudo
Apesar da baixa adesão do cadastro eletrônico de informações clínicas, algumas instituições de saúde dão o exemplo. O Ambulatório Médico de Especialidades (AME) de Piracicaba é um dos casos que contraria a tendência apresentada no estudo e registra todas as informações dos pacientes, desde os dados cadastrais, resultado de exames laboratoriais, diagnósticos até problemas ou condições de saúde do paciente, formando um histórico de anotações clínicas. O estabelecimento de saúde sentiu as mudanças e percebeu os benefícios depois de registrar as informações eletronicamente, quando o processo começou em 2011.
O responsável pela área de Tecnologia da Informação da unidade, Paulo Ferraz afirma que, depois da implantação do sistema, os procedimentos foram otimizados e os pacientes também sentiram a mudança. “Sem dúvida, as melhorias foram percebidas por todos. Os atendimentos passaram a ser mais rápidos. Todos saíram ganhando, mas os pacientes são os mais beneficiados”. Ele explica que isso acontece porque com a migração do papel para a disponibilização das informações em tempo real, os profissionais de saúde ganham tempo e, além disso, quando estão atendendo o paciente têm acesso ao histórico completo. “A diferença é significativa ao começar a utlizar um sistema como esse. Aqui somos uma unidade cirúrgica, e a cada evolução do paciente numa cirurgia, o médico tem que anotar tudo. Com a ferramenta, que inclusive está no centro cirúrgico, os registros são facilitados e ganhamos tempo, reduzindo a duração dos procedimentos”.
Além da facilidade na rotina e agilidade no atendimento, Ferraz ressalta a relevância na parte gerencial. Relatórios, estatísticas e índices também são fornecidos pela ferramenta e auxiliam na tomada de decisão. “A contribuição é especialmente para que as decisões sejam mais certeiras e precisas, e isso reflete na melhoria dos processos, do atendimento e no próprio gerenciamento”.
Mesmo com os benefícios, conforme mostrou a pesquisa TIC Saúde, a adesão aos registros ainda é baixa. Pela experiência com ferramentas de gestão, o responsável de TI da AME Piracicaba ressalta que o dado pode ser reflexo de sistemas difíceis de serem utilizados. “Se o profissional acha complicado, ele já pega o papel para continuar. Mas não acontece isso aqui, pois a ferramenta que utilizamos é fácil. Para engajar os médicos a fazer os registros eletrônicos é necessário convencê-los da importância do sistema e os benefícios que traz. No nosso caso, eles puderam sentir na prática os benefícios e, por isso, foi natural a adaptação”.
Mas, segundo Ferraz um ponto foi crucial para a mudança dar certo. “Não podemos ter um sistema que exija que nossa instituição mude sua rotina para se adaptar a ele, jamais daria certo se fosse assim. No caso da Wareline, a ferramenta é pré-formatada, mas permite a adaptação às rotinas individuais. Outros sistemas não possibilitam isso e aí acontece a baixa adesão dos registros”.