Lembro-me quando criança, indo ao clínico geral em bairro próximo a minha casa para quaisquer problemas que eu tinha.
Eu chegava ao seu consultório, ele fazia toda a triagem ele mesmo, avaliava a situação, se pudesse ele mesmo resolvia e já me prescrevia o tratamento, ou senão, indicava para um especialista para que pudesse tomar conta de mim.
Só muito depois disso ia para um hospital. O prontuário era em papel, porém o meu clínico sabia praticamente tudo o que tinha que saber de mim. Me conhecia e a minha família muito bem. Era praticamente membro dela.
A cultura do pronto atendimento, hoje muito em voga no nosso país não era o caminho. Ante qualquer problema, o primeiro contato, até por telefone era o clínico geral.
No entanto, isso ficou para trás. Hoje em dia, a ida é direta ao Pronto Atendimento, senão direto ao hospital.
Claramente com os custos em alta tanto das equipes médicas e assistenciais que tem que ser deslocadas para estes atendimentos, quanto o prejuízo causado por uso desta infraestrutura muitas vezes sem a mínima necessidade, o custo da saúde acaba se tornando ainda mais ineficiente.
Sistemas de informação hoje são utilizados para que possamos melhorar o atendimento ao paciente na ponta, garantindo sua satisfação e acima de tudo a sua segurança. Porém na maior parte das vezes o que foi feito foi meramente a substituição do prontuário em papel (“Paperless Hospital”) por um prontuário eletrônico.
E isso muitas vezes foi feito a revelia ou sem a participação fundamental da própria equipe que usaria o sistema (Assistencial e Clínica). Não a toa, vemos que uma grande maioria de médicos evita utilizar o sistema, ou pede para a enfermagem fazer a entrada dos dados.
Vê-se um enorme trabalho nestes carrinhos de computadores, onde os enfermeiros passam emaranhados de telas para poder efetuar o controle de suas atividades.
No entanto, os resultados para os quais os sistemas foram desenhados estão muito aquém do que se espera.
Parte porque muitos destes projetos visavam apenas a criação do Hospital Digitalizado (“sem papel”) e não o Hospital Digital que é o caminho que deveríamos atuar e chegar.
O contexto é simples, os sistemas ajudam a controlar o ambiente, permitem melhor segurança ao paciente, e maiores controles financeiros, porém não trazem em si uma melhora efetiva quando se trata de dar retorno às equipes pelas informações ali inseridas.
Neste entremeio, surgem nomes como CPOE(“Computerized Physician Order Entry”) e que em muitos casos é visto apenas como um sistema que permite a entrada de prescrição médica, porém em seu contexto exige muito mais, ou seja, que o médico possa receber do sistema, alertas com relação a interação medicamentosa e até nutricional (Já que ambos andam juntos e afetam diretamente o paciente) e mais ainda, uma orientação a seguir caso se possam usar outras alternativas menos problemáticas. Neste momento é que efetivamente um Hospital Digitalizado vira Hospital Digital. Neste momento há o retorno daquilo que se coloca no sistema.
Idem com relação ao CDSS (“Clinical Decision Support System”), onde o próprio diagnóstico tem uma orientação do sistema apoiando o médico na tomada de decisão em relação a prescrição e tratamento mais correto ao indivíduo.
Na própria área administrativa-financeira, e na gestão do hospital (Ex. BSC), há o mesmo ponto, como retornar inteligência em função das informações coletadas que aumentem a eficiência do hospital e por conseguinte aumente a produtividade dos médicos e enfermeiros.
O aumento das soluções analíticas e principalmente a maturidade que se tem em cada hospital em termos de aplicação destas soluções e consequente crescimento da inteligência artificial, traz ferramentas, pelas quais podemos fazer um ambiente digital.
Isso por si só resolveria na maior eficiência da área ? A resposta é negativa, até mesmo porque sistemas e consultorias para tê-los de forma integral e corretamente utilizados ainda que essenciais e cada vez mais devem ser evoluídos nos hospitais, são custosos.
Portanto, há algo mais a ser feito. E isso está na maneira pela qual hoje nossos cuidados de saúde são feitos.
1-Devemos antes de mais nada trabalhar mais na prevenção. É como a manutenção de uma empresa manufatureira. A manutenção corretiva é sempre mais custosa e interrompe a operação. No caso de saúde, o que os hospitais hoje fazem é exclusivamente a manutenção corretiva.
2-Tratar o paciente como ele realmente é: Um ecossistema per si. Daí a necessidade crescente da medicina integrativa que junta todos aqueles profissionais necessários para o tratamento de um paciente de forma completa e ampla.
3-Lembrar que gradativamente o tratamento, o diagnóstico e a prevenção serão cada vez mais individualizados e sendo feitos enquanto o indivíduo vive sua vida(IOT..), logo os sistemas devem englobar e se integrar com este novo mundo.
4-Devemos ter outro modelo de cuidados com o paciente. Talvez o modelo canadense, ou talvez trazer ao setor privado algumas boas iniciativas do setor público, como as unidades de atenção primária. Porém, em minha opinião, o modelo deveria ser a volta ao modelo antigo. ou seja, voltar ao velho e bom modelo do clínico geral, porém podemos fazer isso utilizando toda a gama de soluções eletrônicas de informação que nos permitem ter o paciente monitorado antes de mesmo de ser um paciente e em suas reabilitações.