A Certificação de Boas Práticas de Fabricação (CBPF) sempre teve como objetivo garantir a qualidade de produção dos produtos de saúde e sempre foi apoiada pelo setor por ser um instrumento que comprova que o processo industrial destes produtos segue as normas de segurança da área.
A partir de 2009, no entanto, quando a Anvisa expediu a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) número 25, que colocava como regra a realização de inspeções internacionais em plantas fabris no exterior para a concessão da CBPF, o instrumento tornou-se o maior “vilão” do mercado de saúde brasileiro. Associações, empresas e até parlamentares se uniram contra a medida da Agência, imputando à CBPF todo o ônus dos atrasos nos prazos de análise da Anvisa, bem como o baixo estímulo à pesquisa e ao desenvolvimento do setor da saúde.
O cerne da questão, porém, não é a emissão ou não da Certificação de Boas Práticas de Fabricação. A existência deste instrumento é adequada e imprescindível para salvaguardar a saúde no nosso País. O problema é que a medida foi implementada de maneira totalmente equivocada pela Anvisa.
Sempre foi, e ainda é, notório que a Agência não tem capacidade operacional para realizar inspeções “in loco” em todos os países que fabricam produtos e têm interesse em vir para o mercado brasileiro.
Diante do caos e da grita geral que as inspeções internacionais causaram, combinada com uma situação calamitosa de atraso que paralisou empresas e investimentos na área de saúde, a Anvisa tentou minimizar a situação, expedindo, em abril deste ano, a RDC nº 15, que revoga RDC anterior relativa ao assunto e determina que, para as classes de risco I e II, ou seja, para produtos e medicamentos de baixo risco, não mais seria expedida a certificação de boas práticas. Porém, outro artigo desta mesma RDC determinava que a CBPF continuasse a ser emitida independentemente da classe de risco do produto. Mais confusão foi gerada.
Não podemos confundir o registro/cadastro de um produto na Anvisa com a certificação de boas práticas de fabricação. O cadastro tem validade de cinco anos e está intrinsicamente ligado às características específicas informadas no momento da submissão do processo para análise dos técnicos da Agência do referido produto.
Outra coisa, bem diferente, é a certificação do sistema de qualidade que vai analisar a fabricação daquele produto. Esta certificação tem validade de dois anos e representa a chancela de que o fabricante pode reproduzir industrialmente todas as características informadas no cadastro do produto.
Todos os países líderes na produção da saúde possuem certificações de seus processos e do sistema de qualidade dos fabricantes. Porém, essa inspeção é delegada a organismos certificadores privados, previamente credenciados para a função, as chamadas OCPs, as quais inspecionam as plantas industriais para a concessão da CBPF.
Ora, se quando uma empresa brasileira quer exportar seu produto ao exterior ela deve se certificar, autorizar produtos importados sem qualquer certificação de processos, nos termos da norma brasileira, é gerar uma enorme desvantagem competitiva e desvalorizar o esforço do governo em ampliar a transferência de tecnologia e o fortalecimento do Complexo Industrial da Saúde nacional.
Abolir ou desvalorizar a CBPF por incapacidade da Anvisa em realizar a sua auditoria, sem haver uma ação que garanta o processo de qualidade produtivo de uma empresa, seja ela nacional ou estrangeira, não resolve o problema, mas sim, abre frente para surgir no mercado produtos de procedência duvidosa e deixar cada vez mais o consumidor e o profissional da saúde sem proteção.
Profissionais da saúde, empresas do setor e associações devem se unir para requerer o fortalecimento da CBPF, propondo que as inspeções sejam feitas por OCPs e que tenham processos interdependentes aos de registro e cadastro. Assim teremos uma indústria qualificada e o fluxo regulatório mais célere e racional.